AO JUÍZO DE DIREITO DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO DE JANEIRO/RJ
PRIORIDADE NA TRAMITAÇÃO – PORTADOR DE HIV PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA
NOME DO AUTOR , brasileiro, solteiro, portador da cédula de identidade nº […], inscrito no CPF sob o nº […] , residente e domiciliado na Rua […], bairro […], Rio de Janeiro – RJ, CEP […], vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, por meio de seu procurador (procuração anexa), propor a presente
AÇÃO PREVIDENCIÁRIA DE RESTABELECIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA C/C PEDIDO DE CONVERSÃO EM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ C/C PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA (após perícia)
Em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS), pelos seguintes fundamentos fáticos e jurídicos que passa a expor:
DOS FATOS E FUNDAMENTOS JURÍDICOS
A Parte Autora auferiu o benefício de auxílio-doença previdenciário, concedido administrativamente, conforme comprova a documentação carreada anexa nos autos.
Todavia, após incoerente reavaliação na esfera administrativa, foi cessado o benefício até então percebido, sob a alegação de inexistência da incapacidade ao trabalho.
Por tal motivo, se ajuíza a presente demanda.
Dados sobre o processo administrativo:
Benefício concedido Auxílio-doença previdenciário
Número do benefício […]
Data do inicio do benefício […]
Data da cessação […]
Razão da cessação Parecer contrário da perícia médica.
Dados sobre a enfermidade:
Doença/enfermidade: Doença pelo vírus HIV (CID 10 B24) e doenças oportunistas descritas
Limitações decorrentes: Apresenta incapacidade para as atividades laborativas habituais.
Dados sobre a ocupação:
Ocupação Supervisor
Descrição sumária Realizar visita nas empresas e supervisão da execução de serviços. Visitar empresas onde se prestam os serviços e averiguar a devida
Condições Gerais de Exercício: execução dos mesmos, mormente os de limpeza. Empresas a serem visitadas situadas no Rio e Região Metropolitana. Contato com materiais Químicos.
Conforme diversos atestados médicos comprovando o histórico clínico do Autor, o mesmo é doente pelo vírus da imunodeficiência humana (CID 10 B24), patologia que, mesmo em tratamento há longo tempo, compromete sua imunidade e propicia o acometimento da Demandante por doenças oportunistas, comprometendo seu estado de saúde de forma geral.
Em decorrência disto, duas graves doenças oportunistas surgiram, conforme se comprova nos receituários anexos.
A enfermidade HIV foi descoberta em 2017, quando logo após foi constatado um grave caso de meningite bacteriana, que deixou o Autor internado no Hospital […] por dois meses, após sendo transferido para o Hospital dos S[…], ficando neste último por 4 meses.
Após enfrentar o quadro descrito acima, em razão do HIV surgiu nova doença oportunista, desta vez uma encefalite grave, que deixou o Autor internado por mais 2 (dois) meses.
Após a estabilização do quadro de encefalite, o Autor retornou ao labor, contudo, contraiu uma pneumonia bacteriana, sendo esta logo controlada, ficando o Autor afastado do labor por menos de 15 dias.
Como se observa, em que pese o Autor tentar o retorno ao trabalho, a doença HIV o impossibilita sobremaneira, visto que o enfraquece e faz surgir diversas doenças oportunistas graves, com risco de morte.
Vejamos o quadro delineado pela Dra. […] ([…]), médica especialista em Infectologia, em 18/12/2019:
[…]
Rio, 18/12/2019
Tal quadro clínico foi delineado em dezembro de 2019 e considerando que o Autor já foi acometido por doenças oportunistas e em razão do seu labor, há grande chance desse quadro voltar a ocorrer, medida que se impõe é outra senão o deferimento da presente ação.
Assim, é notório que submeter o Autor ao labor nas condições atuais é atentar frontalmente aos princípios da Seguridade Social, visto que o mesmo fez sua contrapartida de
contribuir para o sistema previdenciário e no momento em que necessita, eis que incapaz de laborar, não tem o devido amparo da Previdência.
Além disso, sabe-se que a doença causada pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) é fonte e reflexo de discriminação sistemática. Sob esse prisma, a Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais (TNU) aprovou a Súmula nº 78, consolidando a orientação de que a incapacidade do doente pelo vírus HIV deve ser analisada em sentido amplo, ou seja, não limitada apenas às condições físicas do segurado:
Comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisar a incapacidade em sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença.
Conforme sentença recente exarada pelo Juízo da 1ª Vara Federal de Santa Maria, “o estigma social decorrente de enfermidades que causam mudanças na aparência física e estética (vitiligo e outras doenças de pele), ou que não possuem cura (AIDS) ou, ainda, que geram reprovação e aversão popular, como a hanseníase (lepra) e a obesidade mórbida, deve ser analisado pelo magistrado de modo contextualizado e utilizado para caracterização da incapacidade nos benefícios por incapacidade” (processo nº 5005762-35.2016.4.04.7102).
Assim, a patologia que acomete a parte Autora, aliada às doenças oportunistas que o acomete em razão da baixa resistência imunológica e à elevada estigmatização social que sofre em razão da doença, atua diretamente sobre a sua capacidade de desempenhar seu labor habitual.
Além das patologias incapacitantes, o ambiente de trabalho e seu respectivo modus operandi corroboram para o agravamento do estado de saúde da Parte Autora. Nesse sentido, tem-se uma dupla faceta nesta relação patologia-trabalho: de um lado a doença possui o condão de impossibilitar o exercício da atividade laborativa, e de outro, a própria ocupação além de agravar o estado incapacitante é o próprio parâmetro para estabelecer a incapacidade. Ou seja, a soma das funções exercidas no desempenho do labor com a patologia é o que permite chegar ao parecer positivo ou negativo quanto à incapacidade.
Dessa forma, diante das graves patologias que acometem a Requerente e das árduas e cansativas funções exercidas pela sua profissão, deduz-se que o mesmo se encontra incapacitado para o trabalho, razão pela qual se postula o restabelecimento do benefício previdenciário de auxílio-doença.
Caso venha a ser apontada sua total e permanente incapacidade, postula a concessão da aposentadoria por invalidez, a partir da data de sua efetiva constatação. Nessa circunstância, importante se faz a análise das situações referentes à majoração de 25% sobre o valor do benefício, independentemente de seu enquadramento no anexo I do Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048/99), conforme art. 45 da Lei 8.213/91.
Ainda, na hipótese de restar provado nos autos processuais que as patologias referidas tão somente geraram limitação profissional à parte Requerente, ou seja, que as sequelas implicam em redução da capacidade laboral e não propriamente a incapacidade sustentada, postula a concessão de auxílio-acidente, com base no art. 86 da Lei 8.213/91.
Por outro lado, cumpre salientar que o Autor preenche todos os demais requisitos genéricos necessários para o restabelecimento da benesse, eis que, tendo sido concedido, anteriormente, o benefício postulado junto ao INSS, carência e qualidade de segurada são matérias incontroversas, pois reconhecidas quando do deferimento administrativo.
Logo, além da incapacidade laboral (do que se postula a realização de perícia judicial para fins de comprovação), a parte Autora satisfaz os critérios legais genéricos exigidos para o restabelecimento do benefício.
A pretensão exordial vem amparada nos artigos 42, 59 e 86 da Lei 8.213/91 e a data de início do benefício deverá ser fixada nos termos dos artigos 43 e 60 do mesmo diploma legal.
DA AUDIÊNCIA DE MEDIAÇÃO OU DE CONCILIAÇÃO
Considerando a necessidade de produção de provas no presente feito, a Parte Autora vem manifestar, em cumprimento ao art. 319, inciso VII do CPC/2015, que não há interesse na realização de audiência de conciliação ou mediação, haja vista a iminente ineficácia do procedimento e a necessidade de que ambas as partes dispensem a sua realização, conforme previsto no art. 334, §4º, inciso I, do CPC/2015.
DA PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL
Considerando que a prova pericial é fundamental para o deslinde das questões ligadas aos benefícios por incapacidade e para uma adequada análise do nexo de causalidade e da consequente incapacidade, faz-se mister que o Médico Perito observe o Código de Ética da categoria, e especialmente em relação ao tema, a Resolução nº 2.183/2018 do CFM, que dispõe sobre as normas específicas de atendimento a trabalhadores. A recente resolução abarca dois pontos fundamentais: 1) a necessidade do Perito analisar o histórico clínico e laboral do segurado, além de seu local e organização de trabalho (incorporando a antiga Resolução nº 1.488/98), e 2) que o perito fundamente eventual discordância com parecer emitido por outro médico, incorporando o Parecer nº 10/2012 do CFM.
Outrossim, também deve ser observado o Manual de Perícias do INSS (2018), que prevê em seu Anexo I diversos pareceres que se aplicam às perícias previdenciárias, dentre os quais o Parecer CFM nº 05/2008, que estabelece que quando houver discordância do médico perito com o médico assistente, aquele deve fundamentar consistentemente sua decisão. Ainda, o item 2.4 do Manual ordena que “O Perito necessita investigar cuidadosamente o tipo de atividade, as condições em que é exercida, se em pé, se sentado, por quanto tempo, com qual grau de esforço físico e mental, atenção continuada, a mímica profissional (movimentos e
gestos para realizar a atividade, etc.)”, além das condições em que esse trabalho é exercido.
Portanto, REQUER a Parte Autora que, quando da realização da prova pericial, sejam observadas as referidas disposições legais, uma vez que não apenas se tratam de normas cogentes e – portanto – vincula a atividade do médico, sob pena de nulidade do laudo pericial, como também não cabe ao Judiciário ser mais realista que o rei, no tocante ao Manual de Perícias editado pelo próprio réu.
DA TUTELA ANTECIPADA
Como já é sabido, para o deferimento da antecipação dos efeitos de tutela, faz-se necessário o preenchimento de fumus boni iuris e do periculum in mora, sendo o primeiro a verossimilhança do direito pretendido, fundamentado nos problemas de saúde delineados nos documentos médicos anexos e o segundo, o perigo do não atendimento imediato da concessão do benefício previdenciário.
No caso em comento, verifica-se que o Autor está desempregado, acometido por enfermidade incapacitante e teve erroneamente seu benefício indeferido, sendo certo que aguardar o julgamento do processo poderá incorrer em prejuízo irreparável ao Autor, vez que o benefício previdenciário tem natureza alimentar, servindo unicamente como meio de subsistência.
Ante todo o exposto, requer a concessão de antecipação dos efeitos da tutela, tão logo seja caracterizada a incapacidade do Autor na perícia técnica, determinando a concessão do auxílio-doença nos valores devidos ou provisoriamente, em 1 (um) salário mínimo.
DO IMEDIATO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES DE FAZER
Conforme inteligência do artigo 43 da Lei 9.099/95 c/c artigo 1º da Lei 10.259/01, no âmbito dos Juizados Especiais Federais o recurso inominado interposto, via de regra, não possui efeito suspensivo. Por este motivo, eventual deferimento do presente petitório compele o INSS a cumprir de forma imediata a decisão de primeiro grau, para o efeito de conceder e implantar o benefício postulado em favor da Parte Autora.
PEDIDOS
EM FACE DO EXPOSTO, REQUER a Vossa Excelência:
O recebimento e o deferimento da presente peça inaugural;
O deferimento da Gratuidade da Justiça, pois a parte Autora não tem condições de arcar com as custas processuais sem o prejuízo de seu sustento e de sua família;
A citação do Instituto Nacional do Seguro social – INSS, para, querendo, apresentar defesa;
não realização de audiência de conciliação ou de mediação, pelas razões acima expostas;
produção de todos os meios de prova, principalmente documental, testemunhal e pericial. Com relação à última, REQUER seja observada a resolução nº 2.183/2018 e o Parecer nº 10/2012 do Conselho Federal de Medicina;
A concessão da antecipação dos efeitos de tutela para, após perícia técnica, conceder provisoriamente o benefício pleiteado;
julgamento da demanda com TOTAL PROCEDÊNCIA, condenando o INSS a restabelecer o benefício de auxílio-doença NB […] desde sua DCB, em 17/09/2019 subsidiariamente:
Conceder aposentadoria por invalidez e sua eventual majoração de 25% à parte Autora, a partir da data da efetiva constatação da incapacidade total e permanente;
conceder auxílio-acidente, na hipótese de mera limitação profissional;
após a sentença de procedência, seja o INSS intimado a cumprir imediatamente a obrigação de implantar o benefício, conforme inteligência do artigo 43 da Lei 9.099/95 c/c artigo 1º da Lei 10.259/01;
pagar as parcelas vencidas e vincendas, desde a DCB em 17/09/2019, monetariamente corrigidas desde o respectivo vencimento e acrescidas de juros legais e
moratórios, incidentes até a data do pagamento;
Em caso de recurso, ao pagamento de custas e honorários advocatícios, eis que cabíveis em segundo grau de jurisdição, com fulcro no art. 55 da Lei 9.099/95 c/c art. 1º da Lei 10.259/01.
Dá à causa o valor de R$ 39.000,00 (trinta e nove mil reais).
Termos em que Pede deferimento.
Local, data
OAB/UF