Aposentadoria por Invalidez restabelecimento laudo detran perícia reconhece incapacidade

RECURSO CÍVEL Nº 5030846-76.2019.4.02.5101/RJ

RELATOR: JUIZ FEDERAL GUILHERME BOLLORINI PEREIRA

RECORRENTE: GEDEAO BATISTA DA SILVA (AUTOR)

RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso inominado interposto pelo autor da ação (evento 98) face à sentença (evento 92) que julgou improcedentes os seguintes pedidos principais:

b) Requer-se a V. Exa. designação de audiência de Conciliação, Instrução, debates e julgamentos, determinando-se a citação do requerido para que, querendo, apresente contestação, sob pena de confissão e revelia, para ao final, julgar procedente o pedido de restabelecimento de aposentadoria por invalidez desde 21-05-2018, nos termos desta inicial, com juros e correção monetária, tornando definitiva a tutela antecipada e, condenando ainda a Requerida no pagamento das custas, despesas processuais, honorários advocatícios, demais cominações legais e, continuar pagando à parte Requerente o benefício de forma permanente, levando-se em consideração o tempo ao qual fez jus ao benefício sem a possibilidade de reinserção no mercado de trabalho. 

c) Requer a exposição dos documentos que estiverem em poder do INSS, desde que sejam imprescindíveis ao esclarecimento dos fatos contidos no processo administrativo, bem como a dispensa da parte autora em apresentar o requerimento administrativo, visto que esse é constante do processo administrativo que está em poder da ré. 

d) Requer o restabelecimento de sua aposentadoria por invalidez e que essa seja transformada em definitiva, caso não entenda dessa forma, requer a nomeação de perito, escolhido por este M. Juízo, para a realização de perícia médica, inclusive os exames necessários e indispensáveis para a constatação da doença, respondendo aos quesitos formulados e apresentados em momento oportuno.

Diz que ainda permanece incapaz para todo e qualquer trabalho. 

Alega que “resta clara a incapacidade total e permanente do Autor para suas atividades laborativas. Contudo, o douto juízo julgou improcedente o pleito autoral apenas com base na indicação de renovação da CNH constante no laudo SABI, anexo pelo Réu bem como pela existência de contribuição previdenciária em 2016, conforme se observa no CNIS anexo. No entanto, há que se observar que a contribuição vertida ocorreu em 2016, portanto, em momento anterior ao caso concreto”.

Afirma que o “exame médico feito pelo DETRAN ocorre no ano de 2017, ao passo que os laudos médicos produzidos pelo juízo foram confeccionados em 2020, com base em diversos outros laudos e devidamente fundamentado pelo perito judicial, ao passo que não se sabe sequer o teor do laudo médico do DETRAN, ora usado como fundamento pelo juízo. Assim, há que se reconhecer que o laudo médico pericial mais recente é apto a comprovar a SITUAÇÃO ATUAL do Autor, de incapacidade, não devendo ser acolhido o entendimento de que o laudo médico para renovação da CNH é apto, no caso concreto, a comprovar a capacidade do Autor para sua atividade laborativa”. Cita jurisprudência.

Argumenta que “não só o Laudo Judicial é meio de prova produzido sob o manto todas as garantias processuais (e equidistante das partes), como também adotá-lo significa aplica r o princípio geral de Direito Previdenciário “ in dubio pro misero ”. Transcreve jurisprudência.

Contrarrazões no evento 103.

É o relatório. Passo a votar.

VOTO

Trata-se de pedido de condenação do INSS a restabelecer o benefício de aposentadoria por invalidez, recebido de 27/2/2014 a 21/9/2018. Antes disso o autor recebeu o benefício de auxílio-doença entre 5/8/2013 e 26/2/2014.

O autor nasceu em 31/10/1973.

A concessão da aposentadoria por invalidez é vinculada aos requisitos qualidade de segurado, carência e incapacidade, conforme se constata pela leitura do art. 42 da Lei 8.213/91:

“A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição”.

Assim, para a concessão do benefício pleiteado, devem restar comprovadas a incapacidade laborativa (para qualquer trabalho) atestada em laudo pericial, a qualidade de segurado e a carência exigida para a implementação do benefício requerido.

Quanto à qualidade de segurado e carência, restam incontroversos nos autos, havendo apenas discussão quanto ao requisito da incapacidade e de sua duração.

Foram realizados dois exames periciais, um por psiquiatra, em agosto de 2019, com as seguintes conclusões principais:

Conclusão: sem incapacidade atual 

Justificativa: O periciado possui diagnóstico de acordo com seu médico assistente de transtorno depressivo, sendo relatado início dos sintomas há cerca de 2 anos. No momento do exame pericial, não apresenta nenhuma alteração psicopatológica, encontrando-se inclusive com seu humor estável, normobúlico e normopragmático. A ausência de sintomatologia no momento, sugere a estabilização de seu quadro clínico, não havendo qualquer prejuízo em suas capacidades laborais pelo ponto de vista psiquiátrico, encontrando-se apto ao retorno de sua atividade laborativa usual de motorista. Vale ressaltar que mesmo fazendo uso de medicação psicotrópica, não faz uso de medicação ansiolítica, apenas antidepressiva e antipsicótica, que não interferem em seus reflexos e em sua capacidade de conduzir veículos. 

– Houve incapacidade pretérita em período(s) além daquele(s) em que o(a) autor(a) já esteve em gozo de benefício previdenciário? NÃO 

– Caso não haja incapacidade atual, o(a) autor(a) apresenta sequela consolidada decorrente de acidente de qualquer natureza? NÃO

Impugnado esse laudo pelo autor da ação (evento 25), outra perícia foi realizada em 16/7/2020 (evento 56).

Veja-se as respostas principais do expert nesse segundo ato:

a) A pessoa periciada encontra-se acometida de alguma patologia ou lesão? Qual(ais)? Mencionar a CID. R- Insuficiencia renal crônica (IRC)/ Transplante renal. CID10: Z94.0/N18.3/F68.8/F32 

b) A patologia ou lesão verificada decorre do trabalho desempenhado pela pessoa periciada? Descrever a etiologia da doença ou lesão verificada. R- Não. Decorre da IRC. 

c) Qual o grau de evolução da(s) patologia(s) verificada(s)? Fundamente, mencionando, inclusive, eventual progressão ou regressão da(s) patologia(s). R- Evolução cronica com necessidade de transplante renal em 2013 e necessidade continua de terapia imunossupressora. Além de desenvolver transtornos psiquiátricos. 

d) Qual a data ou época do início da(s) patologia(s)? Fundamente. R- IRC iniciada em 2011.

f) Informe o Perito a atividade profissional habitual da parte autora. R- Caminhoneiro. g) A(s) patologia(s) verificada(s) acarreta(m) incapacidade para o trabalho na profissão da pessoa periciada? Fundamente. R- Sim. Inapto aos esforços e cuidados contínuos da saúde. 

h) Qual a data ou época do início da incapacidade laborativa? Fundamente. R- Iniciou em 2013, com a necessidade de transplante. 

j) A pessoa periciada esteve em benefício por incapacidade deferido pelo INSS em âmbito administrativo? Em que período? R- Sim, a partir de 2013 até 2018. 

k) Na hipótese de se constatar incapacidade pregressa, indicar quando se iniciou e até quando ela durou. Fundamente. R- Incapacidade iniciada em 2013. 

l) Cite quais as limitações mentais ou físicas a que a pessoa periciada está sujeita (cognição, concentração, relacionamento interpessoal, esforço físico geral ou com alguma parte do corpo, soerguimento de peso, manutenção em determinada posição, exposição ao sol, movimentos repetitivos, exposição ao ruído, etc.). R- Limitações mentais e físicas. 

m) Cite quais as atividades mentais ou físicas que a pessoa periciada está apta a realizar. R- Total inaptidão.

n) Na hipótese de a(s) patologia(s) acarretar(em) incapacidade laborativa para a atividade profissional habitual em ciclos de crise, informar qual a periodicidade das crises e durante quanto tempo elas duram. R- Não ocorre em ciclos.

p) A(s) patologia(a) que acomete(m) a pessoa periciada é(são) passível(eis) de cura, tratamento ou controle que permita a ela a mesma vida laborativa anterior com um mínimo de sacrifício? Fundamente. R- Patologia impede a atividade laborativa. 

q) Informar o tipo de tratamento (medicamentoso, cirúrgico, fisioterápico, etc.), sua duração e se o mesmo é disponibilizado pelo sistema público de saúde no Município ou região de residência da pessoa periciada. Na hipótese de não haver total amparo da rede pública, informar o custo aproximado do tratamento. R- Tratamento medicamentoso e reabilitação/ acompanhamento nefrológico contínuos, sendo disponível pelo sistema público de saúde. 

r) A incapacidade para a profissão da pessoa periciada é temporária, permitindo recuperação, ou é permanente? Fundamente. R- Permanente.

Esse quadro de incapacidade já havia sido atestado pelo INSS em maio de 2018 (Evento 9, LAUDO3, Página 4).

Laudo complementar foi juntado pelo segundo perito, com as seguintes respostas principais:

a) Quais limitações físicas o autor sofre, e se tais limitações permitiriam a reabilitação. R- O tratamento de imunossupressão impede de realizar esforços físicos de leves a moderada intensidade. E os transtornos psiquiátricos o incapacitariam mentalmente/ concentração/socialmente. O não seguimento correto do tratamento pode agravar com rejeição do rim transplantado. Em uso regular de: TACROLIMO, PREDNISONA, EVEROLIMO, OMEPRAZOL, ANLODIPINO, ATENOLOL, LOSARTANA, LEVOMEPROMAZINA, RISPERIDONA, RIVOTRIL, NEUZINE, PREDNISONA, CEFALEXINA, FLUOXETINA. O tratamento medicamentoso gera um baixo poder de concentração e o incapacita fisicamente (tontura, lipotimias e sincopes são frequentes).

PORTANTO CONCLUO QUE O PERICIADO É INAPTO PARA AS FUNÇÕES LABORATIVAS DE MOTORISTA. E NESTE MOMENTO INAPTO A REABILITAÇÃO EM OUTRA FUNÇÃO, PODENDO SER REVISTO FUTURAMENTE.

Disse a sentença:

Há o fato do autor, conforme pontuou o laudo do SABI, ter renovado sua CNH categoria D, em 2017 até 2022. Foi dado prazo para acautelamento da CNH no DETRAN, e o mesmo não retornou, sendo aposentado por invalidez judicialmente. 

Soma-se a isso, o fato de existir contribuições durante o período em que ficou em gozo da aposentadoria por invalidez, em 2016, o que demonstra a prestação de serviços para empresas indicadas (CNIS 4). 

O laudo médico juntado na inicial (ev. 1.8) atesta apenas que o autor deve evitar contatos com pessoas doentes e ambientes mal ventilados, não indicando qualquer tipo de limitação física ou mental em razão do uso de imunosupressores. 

Assim, não vislumbro, pelo conjunto probatório, condições para concessão de auxílio doença ou restabelecimento da aposentadoria por invalidez.

O documento do Evento 9, PROCADM2, Página 1 contém a expressão CESSADO POR RECUPERAÇÃO TOTAL DENTRO 5 ANOS, o que significa que estava sendo aplicada a seguinte regra da Lei nº 8.213/91:

Art. 47. Verificada a recuperação da capacidade de trabalho do aposentado por invalidez, será observado o seguinte procedimento:

I – quando a recuperação ocorrer dentro de 5 (cinco) anos, contados da data do início da aposentadoria por invalidez ou do auxílio-doença que a antecedeu sem interrupção, o benefício cessará:

a) de imediato, para o segurado empregado que tiver direito a retornar à função que desempenhava na empresa quando se aposentou, na forma da legislação trabalhista, valendo como documento, para tal fim, o certificado de capacidade fornecido pela Previdência Social; ou

b) após tantos meses quantos forem os anos de duração do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, para os demais segurados;

II – quando a recuperação for parcial, ou ocorrer após o período do inciso I, ou ainda quando o segurado for declarado apto para o exercício de trabalho diverso do qual habitualmente exercia, a aposentadoria será mantida, sem prejuízo da volta à atividade:

a) no seu valor integral, durante 6 (seis) meses contados da data em que for verificada a recuperação da capacidade;

b) com redução de 50% (cinqüenta por cento), no período seguinte de 6 (seis) meses;

c) com redução de 75% (setenta e cinco por cento), também por igual período de 6 (seis) meses, ao término do qual cessará definitivamente.

Pois bem, deve ser observado que o INSS fez proposta de acordo, conforme Evento 83, não aceito pela parte autora.

Conforme consta da sentença, houve três contribuições para o Regime Geral no ano de 2016: em janeiro, em abril e em dezembro (Evento 9, CNIS5, Página 7).

Esse fato e mais a renovação da CNH promovida pelo autor indicam que ele não estava incapaz totalmente nos anos de 2016 e 2017.

Já em 2018 a situação era diferente, conforme constatou o INSS em maio daquele ano (Evento 9, LAUDO3, Página 4) e também a perícia judicial em julho deste ano.

O que se apresente nos autos atualmente é que o autor está totalmente incapaz para todo e qualquer trabalho de forma TEMPORÁRIA.

Como se vê, portanto, o perito reconheceu incapacidade TOTAL, ou seja, não ocorreu a recuperação da capacidade laborativa da autora, sequer parcialmente, de maneira que seu caso  não se enquadra em nenhuma das hipóteses prevista no art. 47 da Lei 8.213/91, que permitiria a suspensão do benefício. Outrossim, ainda que a incapacidade seja apenas temporária, isto não obsta o restabelecimento da aposentadoria por invalidez, já que o INSS pode convocar o segurado a se submeter a perícias revisionais, exceto em alguns casos, conforme já mencionado (art. 101):

Art. 101. O segurado em gozo de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e o pensionista inválido estão obrigados, sob pena de suspensão do benefício, a submeter-se a exame médico a cargo da Previdência Social, processo de reabilitação profissional por ela prescrito e custeado, e tratamento dispensado gratuitamente, exceto o cirúrgico e a transfusão de sangue, que são facultativos. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 1o O aposentado por invalidez e o pensionista inválido que não tenham retornado à atividade estarão isentos do exame de que trata o caput deste artigo: (Redação dada pela lei nº 13.457, de 2017)

I – após completarem cinquenta e cinco anos ou mais de idade e quando decorridos quinze anos da data da concessão da aposentadoria por invalidez ou do auxílio-doença que a precedeu; ou (Incluído pela lei nº 13.457, de 2017) (Vide Medida Provisória nº 871, de 2019)

II – após completarem sessenta anos de idade. (Incluído pela lei nº 13.457, de 2017)

Portanto, cabível o restabelecimento do benefício.

No entanto, conforme comprovado neste processo, o autor recebeu indevidamente o beneficio entre durante o ano de 2016, quando, inclusive, exerceu atividade laborativa.

Assim, possível o desconto desses valores recebidos indevidamente, conforme o art.115, II, da Lei nº 8.213/91.

Pelo exposto, voto no sentido de conhecer e dar parcial provimento ao recurso, para condenar o INSS a restabelecer o benefício NB 606024618-8. Quanto à correção monetária das parcelas atrasadas, deverá ser observado o indexador INPC, conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento dos embargos de declaração no RE 870.947. Os juros de mora, idênticos aos da caderneta de poupança, são devidos desde a citação da ré. Das parcelas atrasadas deverão ser descontadas as prestações recebidas entre janeiro de dezembro de 2016. Sem honorários. Publique-se e intimem-se. Passados os prazos recursais, dê-se baixa e devolvam-se os autos ao Juizado de origem. É como voto.

Deixe uma resposta