responsabilidade civil do estado

Aula 14: Responsabilidade Civil do Estado

Sejam bem-vindos a esta aula focada em um dos temas mais relevantes e recorrentes no Exame de Ordem e em concursos públicos: a Responsabilidade Civil do Estado. A correta compreensão deste instituto é crucial, pois envolve a proteção dos particulares frente aos atos da Administração Pública.

Vamos abordar a previsão constitucional, os elementos essenciais, as causas excludentes e, por fim, o importante tema do direito de regresso.

Responsabilidade Civil do Estado

I. Previsão Constitucional e Regime Geral

A responsabilidade civil da Administração Pública está expressamente prevista na Constituição Federal, sendo um pilar do Direito Administrativo.

1. Previsão Legal (Base Constitucional): O fundamento jurídico reside no Artigo 37, §6 da Constituição Federal.

2. Regime Adotado: Responsabilidade Objetiva (Teoria do Risco Administrativo) O regime geral adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro é o da responsabilidade civil objetiva.

Esta responsabilidade objetiva baseia-se na Teoria do Risco Administrativo.

A responsabilidade objetiva aplica-se a:

  • Pessoas jurídicas de direito público (União, Estados, DF, Municípios, Autarquias, Fundações Públicas de Direito Público).
  • Pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos (Concessionárias, Permissionárias).

Obrigatoriedade da Ação: A vítima deve ajuizar a ação indenizatória diretamente contra o Estado ou a pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público, e não contra o agente público responsável pela conduta.

II. Elementos da Responsabilidade Objetiva (Ação Estatal)

No regime de responsabilidade objetiva, para que a vítima seja indenizada, não é necessário demonstrar dolo ou culpa (elemento subjetivo) do agente.

Os elementos que a vítima deve demonstrar são:

  1. O ato (conduta) praticado pelo agente público nesta qualidade.
  2. O dano sofrido pelo particular.
  3. O nexo de causalidade (relação direta) entre o ato e o dano.

Responsabilidade por Omissão (Atenção para a Prova): Embora a responsabilidade por condutas ativas seja objetiva, as fontes trazem uma distinção doutrinária crucial para o exame quando se trata de omissão:

Tipo de OmissãoNatureza da ResponsabilidadeRequisito para Indenização
Omissão GenéricaSubjetiva (Regra)É necessário demonstrar dolo, culpa ou a “falta do serviço”.
Omissão EspecíficaObjetiva (Exceção)Aplica-se quando o Estado tem o dever de custódia, proteção ou vigilância (ex: presos, alunos em escola pública).

III. Excludentes de Responsabilidade

A Teoria do Risco Administrativo, adotada como regra, admite causas que podem excluir ou atenuar a responsabilidade do Estado.

1. Causas Excludentes (Rompe o nexo causal):

  • Culpa exclusiva da vítima: Se o Estado comprovar que a culpa pelo dano foi exclusivamente do particular (ex: dirigindo na contramão), o Estado não responde.
  • Caso fortuito ou força maior.
  • Fato de terceiro (em geral).

2. Causas Atenuantes:

  • Culpa concorrente da vítima: Se a vítima também contribuiu para o dano (ex: vítima na contramão e viatura furando o sinal), a responsabilidade é atenuada, havendo redução do valor indenizatório a ser pago pelo Estado.

3. Exceção à Teoria do Risco Administrativo: Teoria do Risco Integral Em casos excepcionais, adota-se a Teoria do Risco Integral, a qual não admite excludentes de responsabilidade. Nesses casos, o Estado sempre responde.

  • Exemplos: Danos nucleares e ataques terroristas em aeronaves (embora este último seja objeto de discussão doutrinária).

IV. Direito de Regresso e Teoria da Dupla Garantia

1. Direito de Regresso: Uma vez que o Estado indeniza o particular, a Constituição assegura o direito de regresso contra o agente público responsável pelo dano.

A ação de regresso possui natureza de responsabilidade subjetiva. Isso significa que o Estado só conseguirá ser ressarcido pelo agente se provar que este agiu com dolo (intenção) ou culpa (negligência, imprudência ou imperícia).

2. Teoria da Dupla Garantia: O Supremo Tribunal Federal (STF) abraça a Teoria da Dupla Garantia. Essa teoria visa proteger tanto a vítima quanto o servidor:

  • Garantia à Vítima: Tem a segurança de ser indenizada pelo ente público (que geralmente tem maior capacidade financeira) por responsabilidade objetiva.
  • Garantia ao Agente Público: O agente tem o direito de ser processado apenas e tão somente pelo próprio Estado (ente), e nunca diretamente pela vítima.

V. Casos Específicos de Responsabilidade

1. Danos Causados por Presos Fugitivos (Nexo Causal): O Supremo estabelece um critério de nexo causal para a indenização quando crimes são praticados por detentos fugitivos.

  • Estado Responde (Nexo Causal Direto): Se o preso fugiu e praticou o crime imediatamente durante a fuga.
  • Estado Não Responde (Nexo Causal Indireto): Se o preso fugiu e praticou o crime muito tempo depois (ex: seis meses ou um ano), pois a correlação direta entre a fuga e o crime é rompida.

2. Morte de Detento em Presídio (Dever de Custódia): O Estado tem o dever de zelar pela integridade física e moral do preso sob sua custódia.

  • O Estado responde se o preso for assassinado ou espancado dentro do presídio.
  • O Estado também responde se o dano ou morte ocorrer por demora na chegada de auxílio médico (nexo causal por omissão específica).
  • O Estado não responde se a morte for causada por um fato alheio à custódia, como um infarto (causa natural), desde que o presídio tenha prestado o auxílio adequado.

3. Concessionárias e Prestadores de Serviços Públicos: As pessoas jurídicas de direito privado que prestam serviços públicos (ex: concessionárias de energia ou transporte) respondem objetivamente pelos danos que seus agentes causem a terceiros.

  • A responsabilidade é objetiva, independentemente de a vítima ser usuária ou não usuária do serviço.

4. Notários e Registradores (Tabeliães e Oficiais de Registro): O Estado possui responsabilidade civil direta, primária e objetiva pelos danos que tabeliães e oficiais de registro (no exercício do serviço público por delegação) causarem a terceiros. Antigamente, a responsabilidade era diretamente imputada ao tabelião, mas o entendimento mudou (em 2019) para responsabilizar o ente público primeiramente.

Esquela para Fixação:

Imagine a Responsabilidade Civil do Estado como um seguro obrigatório de carro (o Estado). Quando ocorre um acidente (o dano), a vítima (o particular) aciona o seguro (o Estado) diretamente, de forma objetiva, provando apenas que o carro do Estado (a conduta) causou o dano.

O seguro (Teoria do Risco Administrativo) paga, mas verifica se a culpa foi exclusiva da vítima (excludente). Posteriormente, o seguro (o Estado), se houver pago, aciona o motorista (o agente público) em uma ação de regresso, mas aí precisa provar que o motorista foi imprudente ou negligente (subjetividade). Esta “obrigação dupla” é a essência da Dupla Garantia.

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