A Teoria Geral dos Contratos é um tema central e estruturante do Direito Civil Patrimonial e aparece frequentemente nas questões da prova de Direito Civil, exigindo uma compreensão aprofundada de seus princípios.
O contrato é um negócio jurídico bilateral. Sua base de estudo pressupõe o conhecimento prévio do negócio jurídico.
I. Conceito e Fundamentos do Contrato
O contrato, segundo a doutrina moderna, é o negócio jurídico bilateral pelo qual as partes buscam criar um vínculo patrimonial. Seu objetivo é criar, regular, modificar ou extinguir obrigações entre elas.
A visão contemporânea do contrato visa tutelar os interesses privados dos agentes de forma justa e equilibrada, bem como o interesse público e social, através de disposições que não prejudiquem a sociedade nem terceiros.
1. Concepção Clássica (CC/1916)
A concepção clássica, inspirada no Direito Romano e no Código Civil de 1916, era marcada pelo individualismo e patrimonialismo. O contrato era visto como uma fonte de deveres e obrigações, assim como a lei e o ato ilícito. Esta visão enfatizava a autonomia da vontade e a obrigatoriedade do cumprimento das obrigações.
2. Base Constitucional
A base do Direito Contratual é encontrada na Constituição Federal, mais precisamente no Artigo 5º, inciso II, que estabelece que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Contratar é, portanto, uma faculdade, não uma obrigação.
O estudo atual do Direito Contratual exige a ponderação entre o caráter individualista (liberdade de contratar e cumprimento das obrigações) e a garantia de direitos como a dignidade da pessoa humana, a justiça social e a função social do contrato.
II. Os Princípios Norteadores da Teoria Contratual
Os princípios contratuais são divididos em clássicos e contemporâneos. Os princípios contemporâneos mitigam (atenuam ou reduzem o alcance), mas não extinguem os princípios clássicos, sendo a solução dos conflitos feita pela ponderação.
A. Princípios Clássicos
- Autonomia da Vontade: É a base do direito contratual e remonta à liberdade que as partes possuem em contrair ou não obrigações. É um direito de primeira geração (políticos individuais). Contudo, é mitigado hoje pela boa-fé e pela função social.
- Obrigatoriedade do Cumprimento (Força Vinculante): Decorre da livre e espontânea vontade de se obrigar. Se a pessoa exerce a liberdade de contratar e decide fazê-lo, deve-se observar e cumprir estritamente o que obrigou. Disso surge o famoso jargão Pacta Sunt Servanda. Este princípio visa a segurança jurídica.
- Relatividade dos Efeitos do Contrato: Contém a ideia de que os efeitos do contrato só se manifestam entre as partes contratantes, não aproveitando nem prejudicando terceiros, pois estes não participam da relação.
B. Princípios Contemporâneos
Os princípios contemporâneos incidem diretamente sobre os clássicos.
- Boa-fé Objetiva: É uma cláusula geral de qualquer relação jurídica. Possui caráter objetivo (comportamento alheio), e não subjetivo (concepção valorativa pessoal). Ela pressupõe lealdade, equidade e dever de informação, evitando a má-fé e práticas abusivas.
- Função Interpretativa: Os contratos de adesão, por exemplo, devem ser interpretados de modo a beneficiar o aderente (parte economicamente mais fraca).
- Função Integrativa: Mantém deveres mesmo fora da fase de cumprimento (como dever de informação desde as tratativas até a extinção).
- Função Limitadora: Veda a prática de cláusulas abusivas.
- Função Social do Contrato: Busca proteger a parte hipossuficiente (vulnerável) contra o poder econômico da outra. Impõe deveres para com terceiros, limitando a relatividade dos efeitos do contrato.
- Dirigismo Estatal: É o Estado intervindo no direito absoluto de liberdade de contratar.
- Limitação do Objeto: Não se pode contratar sobre todo e qualquer objeto se isso afetar a sociedade.
- A função social não elimina a autonomia contratual, mas a atenua, principalmente quando há interesses meta-individuais ou relativos à dignidade da pessoa humana.
- Equilíbrio Contratual: Visa garantir a manutenção das condições inicialmente contratadas. Mitiga a obrigatoriedade do cumprimento (Pacta Sunt Servanda).
- Teoria da Imprevisão (Rebus Sic Stantibus): Aplica-se se ocorrer superveniente onerosidade excessiva para uma das partes. Nesse caso, o contrato pode ser readequado à realidade, por não ser mais justo. A cláusula rebus sic stantibus combate a obrigação absoluta, e a intervenção estatal visa garantir a justiça.
III. Tutelas Específicas do Contrato Comutativo Oneroso
A proteção do contrato oneroso (onde ambas as partes têm ganhos) e comutativo envolve garantias legais que são pontos cruciais do exame de ordem.
A. Vícios Redibitórios (Vícios Ocultos)
Vício Redibitório é o vício oculto que torna a coisa imprópria para o fim a que se destina ou diminua o seu valor.
- Pressupostos: O vício deve ser: oculto (não aparente ou de fácil constatação), anterior à tradição (entrega da coisa), e o adquirente não deve conhecê-lo.
- Natureza: Decorre de relação civil (entre particulares), diferente dos vícios do produto, que decorrem da relação de consumo.
- Contratos Aplicáveis: Aplica-se a contratos comutativos onerosos. É aplicável nas doações onerosas (com encargo), mas não nas doações puras (“cavalo dado não se olha os dentes”).
- Ações Edilícias (Garantias Processuais): A vítima pode escolher entre duas ações, que seguem o rito do procedimento comum (não são ações especiais):
- Ação Redibitória: Busca a resolução do contrato com a devolução do valor pago.
- Ação Estimatoria (Quanti Minoris): Busca o abatimento do preço.
- Perdas e Danos: As perdas e danos (violação a direitos subjetivos) só são cumuláveis com as ações edilícias se o alienante sabia do vício.
- Prazos: A proteção contra vícios redibitórios gera um direito potestativo e está sujeita a prazos decadenciais (Art. 445, CC).
B. Evicção
A evicção é a perda total ou parcial de um direito em razão de uma decisão judicial ou administrativa que declara que esse direito pertence a um terceiro (o evictor).
- Partes: Ocorre a perda do direito pelo Evicto (o adquirente), em favor de um Terceiro (o evictor), sendo o Alienante a pessoa que transmitiu o bem.
- Defesa: O adquirente (evicto) pode buscar a proteção por meio da denunciação da lide (no processo civil) ou por uma ação autônoma de indenização.
- Prazos: A proteção contra a evicção gera um direito potestativo e também está sujeita a prazos decadenciais.
Conclusão Sintetizada:
A Teoria Geral dos Contratos reflete a evolução do Direito Civil, movendo-se de uma concepção meramente individualista (Pacta Sunt Servanda) para uma socialmente orientada (Função Social e Boa-fé Objetiva). A análise de um contrato para o Exame de Ordem deve sempre passar pela verificação da validade e da incidência desses seis princípios, além das garantias específicas, como os Vícios Redibitórios e a Evicção.
